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sábado, 29 de janeiro de 2011

Além do Bem e do Mal - 11 (Nietzsche)


Parece-me que hoje todos se esforçam para minimizar a influência real que Kant exerceu na filosofia alemã e sobretudo insinuar prudentemente o valor que ele próprio se atribuía. Kant se orgulhava, antes de tudo, de sua tabela de categorias. Com essa tabela na mão dizia: "Isso é a coisa mais difícil que já pôde ser realizada em prol da metafísica". Compreenda-se bem esse "pôde ser"! Ele se sentia orgulhoso por ter descoberto no homem uma nova faculdade, a faculdade do juízo sintético a priori. Bem que cometeu um erro nesse ponto, pois o desenvolvimento e o rápido florescimento da filosofia alemã não deixam de ter menos participação nesse orgulho e no zelo que incitou a todos os jovens pensadores a descobrir, se possível, alguma coisa que os orgulhasse mais ainda - a descobrir, em todo caso, "novas faculdades". Mas reflitamos um pouco, posto que ainda temos tempo! De que modo são possíveis os juízos sintéticos a priori? se perguntava Kant. E que respondia? Por meio de uma faculdade. mas infelizmente não com essas poucas palavras, e sim de modo tão cerimonioso, tão venerável, com tal esbanjamento de profundidade e filigranas alemãs, a ponto de esquecer a alegre tolice alemã que se oculta no fundo de semelhante resposta. Melhor ainda, todos se sentiram tomados de alegria diante dessa descoberta de uma nova faculdade e o entusiasmo chegou ao cúmulo quando Kant acrescentou uma nova descoberta, uma faculdade moral no homem - pois naquele tempo os alemães ainda eram morais e ignoravam o realismo político. Essa foi a lua-de-mel da filosofia alemã. Todos os jovens teólogos do seminário de Tübingen se dedicaram a pesquisar para descobrir novas "faculdades". E o que foi que não se descobriu, durante esse período ainda tão juvenil da filosofia alemã, esse período inocente e rico, em que o romantismo, gênio maldoso, tocava e entoava sortilégios, quando não se sabia ainda distinguir entre "descobrir" e "inventar"! Descobriram principalmente uma faculdade para as coisa "supra-sensíveis". Schelling a denominou intuição intelectual, satisfazendo assim aos mais fervorosos desejos dos alemães, repletos de aspirações piedosas. A pior injustiça que se pode cometer contra esse impetuoso e entusiasta movimento que era só juventude, embora se disfarçasse audaciosamente com um manto de idéias cinzentas e senis, seria tê-lo levado a sério, tratá-lo realmente com indignação moral. Em resumo, tornaram-se mais velhos - e o sonho se desvaneceu. Chegou o momento em que passaram a esfregar os olhos. Antes de todos e em primeiro lugar, o velho Kant. "Por meio de uma faculdade", havia dito, mas queria dizer pelo menos. Mas isso é uma resposta? Uma explicação? Ou melhor, não é a simples repetição da pergunta? Por que o ópio faz dormir? "Por meio de uma faculdade", pela virtus dormitiva - respondia o médico de Molière:

"Quia est in eo virtus dormitiva
cujus est natura sensus assoupire"
[porque há nele uma faculdade dormitiva,
cuja natureza é entorpecer os sentidos]

Mas semelhantes respostas são convenientes para a comédia e finalmente chegou o tempo de substituir a pergunta de Kant: "Como são possíveis juízos sintéticos a priori?", por uma outra pergunta: "Por que é necessária a crença em tais juízos?" - isto é, de compreender que, para o fim da conservação de seres como nós, é preciso acreditar que tais juízos são verdadeiros; com o que, naturalmente, eles também poderiam ser falsos! Ou, dito de maneira clara e crua: juízos sintéticos a priori não deveriam absolutamente "ser possíveis": não temos direitos a eles, em nossa boca são somente juízos falsos. Mas é claro que temos que crer em sua verdade, uma crença de fachada e evidência que pertence à ótica-de-perspectivas da vida. - Por fim, considerando ainda a enorme influência que a "filosofia alemã" - espero que se entenda o seu direito às aspas - tem exercido na Europa, não se duvide que uma certa virtus dormitiva teve participação nisso: nobres ociosos, virtuosos, místicos, artistas, cristãos três-quartos e obscurantistas políticos de todas as nações estavam encantados possuir, graças à filosofia alemã, um antídoto para o sensualismo ainda predominante que do século anterior transbordou para este; em suma - "sensus assoupire"...

sexta-feira, 7 de janeiro de 2011

Immanuel Kant


Kant nasceu, estudou, lecionou e morreu em Koenigsberg. Sua vida foi austera e regular como um relógio. Sofreu influências do pietismo, protestantismo luterano de tendência mística e pessimista e do Racionalismo de Leibniz. Mas, foi D. Hume que o fez acordar do seu sono dogmático. Em 1781 publica a Crítica da Razão Pura, sua obra maior, onde distingue o conhecimento sensível (que abrange as intuições sensíveis) e o conhecimento inteligível (que trata das idéias metafísicas). Neste livro explica essencialmente porque as metafísicas são voltadas ao fracasso e porque a razão humana é impotente para conhecer o fundo das coisas. Neste livro Kant tenta responder três questões fundamentais da filosofia: Que podemos saber? Que devemos fazer? Que nos é lícito esperar?

Kant tentou nos mostrar que, embora não possamos confiar em nossos sentidos para receber diretamente informações sobre a realidade, eles nos informam como a realidade aparece para nós. E a aparência da realidade não é apenas obra de hipóteses, como Hume afirmou, ela aponta além da experiência para a unidade transcendente entre a aparência do mundo e o que ele realmente é. Kant distinguiu entre o que o mundo realmente é e sua aparência. A aparência das coisas ele chamou de fenômeno. O mundo real ele denominou noúmeno ou a coisa-em-si. Afirmou que, embora não possamos conhecer o noúmeno diretamente, podemos apreendê-lo baseados na maneira como percebemos o mundo como fenômeno. Ou seja, Kant diz que jamais podemos experimentar a coisa-em-si diretamente. Tudo o que podemos conhecer diretamente são os fenômenos, que é aquilo que se apresenta ao nosso entendimento. Kant denominou “Categorias do Entendimento” os conceitos que organizam a realidade permitindo-nos compreender a experiência. Esses conceitos são: espaço, tempo, substancia e causalidade. Kant denominou esses conceitos de a priori. Conceitos a priori, vêm antes da experiência; eles tornam a experiência possível. Ou seja, não são conceitos que as pessoas formularam; eles existiam antes de nossa existência, antes de sequer pensarmos neles. Mas eles são necessários para que possamos compreender as coisas.

Com a Crítica da Razão Pura, Kant pretende um estudo sobre os limites do conhecimento. Seu método é a crítica, isto é, a analise reflexiva, onde a razão critica a si mesma, o que consiste em remontar às condições que tornam o conhecimento legítimo. Kant fez uma analogia entre sua abordagem da relação entre experiência e entendimento e a explicação de Copérnico sobre a relação entre a Terra e o Sol. Assim invertendo a atitude empírica em relação ao conhecimento, Kant, em vez de dizer que o conhecimento deve se conformar aos objetos, ele disse que os objetos devem se conformar ao conhecimento. Ou seja, os objetos são organizados pela mente; e como a mente organiza a realidade, permite-nos compreender a experiência.

Partindo da distinção de Hume entre idéias sobre o que existe e idéias sobre o que deveria ser, Kant propõe a visão de que existem categorias objetivas do pensamento moral. Ele se referiu ao pensamento moral como Razão Prática, o raciocínio sobre como deveríamos agir. Ele opôs a “razão prática” à “razão pura”, o raciocínio sobre o que existe. Em seu estudo da razão prática, Kant sustentou que podemos ter idéias universalmente válidas sobre o que deveríamos fazer, denominadas “imperativos”.

Kant descreveu o “imperativo categórico”, que possibilita o julgamento prático, assim como as categorias de substância, qualidade, etc. possibilitam o entendimento. O imperativo categórico, disse ele, é um “conceito a priori”. Podemos ver que é verdadeiro antes da experiência. Kant descreveu o imperativo categórico como uma lei moral universal. O imperativo categórico é uma lei moral que é válida para todo mundo e forma a base de nossa razão prática, ou entendimento moral. Não apenas se refere a como devemos agir, mas permite que nos comportemos como seres morais. Podemos dizer que nossas ações estão de acordo com essa lei se forem corretas e morais pra todos.